No voto, o ministro Gilmar Mendes, relator do caso, entendeu que a cessão do espaço para sepultamento abarca o serviço de custódia dos resto...
Os municípios passaram a poder tributar, pelo ISS, a transferência do direito de uso do espaço em cemitério a partir da Lei nº 157, de 2016. A norma incluiu a operação de serviços funerários na lista prevista no anexo da Lei Complementar nº 116, de 2003 - que regula a exigência do imposto.
Mas, de acordo com Ricardo Almeida, assessor jurídico da Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais (Abrasf), “a maioria [das empresas] não recolhia e muitos municípios não cobravam [o imposto]”.
Interessada na causa, a entidade atuou no julgamento do STF como “amicus curiae”. Segundo Almeida, empresas que exploram o serviço funerário em áreas privadas e aquelas que possuem concessão em áreas públicas são impactadas pela decisão da Corte, que aumentará a arrecadação dos municípios.
Na ação ajuizada no STF, a Associação dos Cemitérios e Crematórios do Brasil (Acembra) pedia que os ministros considerassem a cobrança inconstitucional. Argumentava que a cessão envolve uma transferência do direito de uso para alguém. Não se trataria, portanto, de uma obrigação de fazer, um esforço humano de prestar um serviço - que gera o dever de recolher o ISS.
Além disso, a entidade buscava a aplicação ao caso de entendimento do STF sobre a proibição da exigência do ISS sobre locação de bens móveis - posição prevista na Súmula Vinculante nº 31.
Na sustentação oral, a advogada Renata Andréa Joner Parry, que representou a Acembra no julgamento, defendeu que a cessão do espaço para sepultamentos é contratada de forma autônoma, sem vinculação com a manutenção ou a administração de jazigos.
“A cessão de espaço em cemitério é, em regra, perpétua. Em razão disso, é passível de doação ou transmissão hereditária sendo que, em alguns Estados, esse direito fica submetido ao ITCMD [Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação]”, afirmou a especialista, do Veirano Advogados.
No voto, o ministro Gilmar Mendes, relator do caso (ADI 5869), entendeu, no entanto, que a cessão do espaço para sepultamento abarca o serviço de custódia dos restos mortais. Seria, portanto, segundo ele, uma atividade mista, que envolve tanto prestação de serviço quanto fornecimento de mercadoria.
“A previsão de incidência do ISS sobre ‘cessão de uso de espaços em cemitérios para sepultamento’ não pode ser reduzida a uma mera obrigação de dar, no sentido de locação do espaço físico pura e simples, a atrair a ratio decidendi da Súmula Vinculante nº 31”, disse, no voto. Isso porque, acrescentou, tal atividade abarca também a custódia e a conservação dos restos mortais, “as quais indubitavelmente se enquadram no conceito tradicional de serviços”.
De acordo com Ricardo Almeida, da Abrasf, a manutenção e conservação do local cedido são obrigatórias para o cumprimento de normas ambientais e sanitárias para fins de salubridade e saúde pública.
Nos contratos mistos - que envolvem fornecimento de mercadoria e prestação de serviços -, abre-se uma histórica disputa jurídica entre Estados e municípios sobre o direito de tributar a operação, pelo ICMS (Estados) ou pelo ISS (municípios).
Segundo o ministro Gilmar Mendes apontou no voto, a tendência mais recente do STF, nessas situações, tem sido “superar definitivamente” a dicotomia entre obrigações de dar e de fazer para definir a quem cabe tributar a operação - aos Estados, com o ICMS, na primeira hipótese ou aos municípios, com o ISS, na segunda.
A lei do ISS, de acordo com ele, é “peça fundamental” para verificar se atividades mistas se submetem ao imposto sobre serviços ou se, de forma residual (expressa ou presumida), sujeitam-se ao ICMS.
“Primeiro deve-se verificar se estas estão elencadas no rol taxativo da Lei Complementar nº 116/2003 (ISS) e, não havendo sujeição expressa daquela atividade, residualmente passam a ser enquadradas na tributação pelo ICMS, sem olvidar as exceções expressas na lista em anexo àquela lei complementar, como, por exemplo, o item 7.02”, afirmou o ministro.
Procurado pelo Valor, o Veirano Advogados, que defende a Acembra, informou que aguarda a formalização do acórdão para avaliar o cabimento de eventual recurso.
Da redação com informações do Valor Econômico.
Nenhum comentário